Visit Portugal

O olhar criativo de

Gonçalo Cadilhe

Um dos escritores de viagens mais famosos de Portugal aventurou-se connosco pela região que o viu nascer.

Gonçalo Cadilhe é escritor de viagens, documentarista, surfista, fotógrafo de viagens. Começou a viajar e a publicar de forma profissional em Fevereiro de 1992. Organiza viagens pelo mundo todo com o tour operator Pinto Lopes Viagens.

Tem quinze livros publicados. Viagens, biografias históricas, surf e encontros de vida são os seus temas de eleição. Entre os vários títulos, destacam-se “Planisfério Pessoal”, onde relata uma volta ao mundo de 19 meses sem recorrer ao transporte aéreo; “Nos Passos de Magalhães”, uma biografia itinerante narrada nos lugares da vida do navegador; “África Acima”, que descreve uma travessia do continente africano desde a Cidade do Cabo até Tânger viajando apenas à boleia ou nos meios de transporte público locais; e ainda “Nos Passos de Santo António” viagem laica onde o autor nos apresenta o santo português como o primeiro grande viajante da História de Portugal; “Passagem para o Horizonte”, onde descreve doze meses de viagem à volta do mundo em busca do seu ideal de doze ondas perfeitas, alocando um mês de espera a cada onda escolhida.

Descubro que afinal renaturalizar não se refere apenas à natureza, mas também à minha redescoberta das paisagens naturais de Portugal.

À medida que vou ganhando altitude e penetrando na metade escondida do meu país, o espaço alarga-se, a paisagem torna-se difícil de domesticar, salta à vista a evidência que vidas muito duras foram acontecendo aqui ao longo dos séculos. O solo é áspero e avaro, os planaltos possíveis de cultivar demoram pouco a ser atravessados e logo dão lugar a falésias danadas, desfiladeiros vertiginosos, becos geológicos que se tivessem uma expressão humana seria a de um sardónico cinismo.

Mas depois, surgem as aldeias. São, também elas, severas, monocromáticas, angulares. São duras. Poderiam, tal como a paisagem, indicar-me que eu teria de trabalhar a minha sensibilidade para conseguir sentir-me cativado pela sua extraordinária beleza metafísica. Pelo contrário, as aldeias não me transmitem inquietude e sujeição. Se tivessem uma expressão humana, seria a de um abraço desajeitado, rude, mas sincero e caloroso. E eu sinto-me imediatamente acolhido nesse abraço

Uma viagem pelo interior da Beira revela-se uma janela aberta sobre a eternidade

O que o surpreendeu nesta viagem?

Surpreendeu-me a potência cénica destas aldeias, ainda relativamente preservadas no seu traçado antigo. Uma ou outra vez apareceu-nos uma fachada que adulterava por completo a atmosfera de época do espaço onde nos situávamos, mas no geral foi uma surpresa muito positiva encontrar aldeias com um aspeto histórico tão integro

Conte-nos algo que tenha visto e que nunca tinha visto antes.

bom, as pinturas rupestres do Côa visitadas num tour noturno com um grupo reduzido, sem qualquer outra iluminação para lá do foco das lanternas, e seguindo as explicações claras e informadas dos guias, foi uma "estreia" absoluta para mim

Tinha alguma ideia previamente criada sobre a região e de que forma esta experiência a alterou?

o maior desafio foi tentar encontrar um olhar novo sobre um território que todos julgamos conhecer ou que pelo menos não nos desperta a urgência de conhecer melhor tal como poderá despertar um destino no outro lado do mundo. Foi esse o maior desafio: conseguir esse olhar fresco e livre de preconceitos ou de informação gasta.

Qual foi o seu momento preferido desta viagem?

diria que o momento mais forte e emocionante foi o passeio por Monsanto, sobretudo essa revelação de uma cultura rural completamente imersa na rocha, provavelmente um recurso extremo de combate à pobreza ao longo de gerações e que hoje é apenas uma curiosidade turística. Mas pensar que ao longo de centenas de anos houve uma civilização meio rural meio rupestre que não conhecia outra realidade foi para mim um momento de profunda reflexão e de respeito por todas essas pessoas que ali viveram.